domingo, 2 de agosto de 2009

O MERCADO QUE TUDO CONSOME E A EXPANSÃO DO SISTEMA PENAL: BREVES ANOTAÇÕES

Anderson Couto

A segurança pessoal tornou-se um dos principais pontos de venda, talvez o principal, em toda espécie de estratégias de marketing. O lema “lei e ordem”, cada vez mais reduzido, à promessa de segurança pessoal, tornou-se um dos principais pontos de venda, talvez o principal, nos manifestos políticos e nas campanhas eleitorais. A exibição de ameaças à segurança pessoal tornou-se um dos principais trunfos, talvez o principal, na guerra por audiência na mídia (ampliando ainda mais os êxitos tanto do marketing quanto dos usos políticos do capital do medo).

Zygmunt Bauman

O ato terrorista contra o World Trade Center[1] em Nova York nos Estados Unidos em 2001 pareceu desvelar uma espécie de temor amplamente disseminado que encontrou nesse episódio uma espécie de mola propulsora a incrementar uma demanda por maior controle penal, com a conseqüente relativização das garantias vinculadas às liberdades individuais.

É bem verdade que antes do referido ato terrorista contra as “torres gêmeas” [2] existia certo temor entre indivíduos. Os homens em sociedade sentiam-se bastante inseguros e indecisos diante das rápidas mudanças e do aparecimento de problemas sociais complexos que não mais encontravam respostas nas velhas categorias de cognição vigentes desde iluminismo e ainda superavam as capacidades coletivas de articulação para enfrentá-las e as possibilidades de seguridade das estruturas sociais de proteção.

Tal sentimento de perplexidade diante dos novos riscos, advindos dos problemas complexos, [3] ainda era intensificado subjetivamente por causa da falta de referenciais precisos e firmes para ação social em virtude da crise das redes de proteção social no Neoliberalismo. Um dos fatores que fez – ao lado da degradação ambiental, do intenso progresso tecnológico, etc – com que alguns estudiosos chamassem a sociedade contemporânea de “sociedade do risco”. [4]

Desse modo, de certa forma antes dos ataques terroristas em 2001 existia forte pendor para o pânico coletivo esperando ser “desnudado”, uma verdadeira “bomba” esperando explodir, pois já era suscetível nas relações sociais a propensão ao “histerismo” e ao clamor por segurança. Havia à época endemicamente espalhado na ambiência social grande sensibilidade aos apelos pela ampliação do aparato punitivo estatal e grande bramido por líderes ou soluções quase messiânicas para as causas de insegurança. [5]

Depois do ataque terrorista, amplamente divulgado nos “quatro cantos” do mundo pelas redes midiáticas ao estilo de um “verdadeiro” espetáculo [6], parece que todos os temores citados foram ampliados com conseqüências alarmantes para o sistema penal, em novo tipo, esse fenômeno parece indicar, de controle social pós-panóptico que procede à normatização dos comportamentos individuais através de imagens e mensagens que perpassam o corpo social sem as limitações do modelo institucional.

Assim, o medo, enormemente disseminado entre as pessoas, ampliou suas danosas influências e invadiu setores importantes da sociedade tornando mais pungente a crise das instituições e valores tradicionais. Formou-se então uma conjuntura de grandes proporções que possibilita afirmar que o sentimento de pânico depois do ato terrorista veio ocupar o principal vetor de organização social. O medo tornou-se um sentimento que parece informar hegemonicamente as relações sociais entre as pessoas na sociedade contemporânea.

Os homens vivem em uma sociedade que, além de ser pautada no risco [7], ainda é amplamente obcecada pelo medo, possivelmente utilizado e canalizado para o implemento desarrazoado do controle formal penal. Dessa forma, o medo, por diversos motivos e causas, tem sido o principal motor da expansão das agências do sistema penal, e torna-se nesse sentido a provável “via mestra” de inteligibilidade do fenômeno.

Sobre as possíveis causas do medo cabe destacar que na época atual existe explícito declínio dos ideais ou dos modelos paradigmáticos de agir socialmente, vigentes outrora. Essa situação traz consigo grande desorientação social que ainda é intensificado pelo correlato surgimento do imperativo cultural de “gozo infinito generalizado” intermediado pelas novas técnicas de controle dos comportamentos que colocam os indivíduos em continuas situações de risco e permeiam no âmbito social um sentimento de angústia e ansiedade.


No estágio do capitalismo tardio, a cultura em si torna-se o principal determinante da realidade social, econômica, política e mesmo psicológica. Houve, diz, Jameson, “uma expansão prodigiosa da cultura por todo o reino social, ao ponto em que tudo e, nossa vida social – do valor econômico e poder de estado às práticas e à própria estrutura da psique – pode ser considerado como tendo se tornado “cultural” em algum sentido original e ainda não codificado em “teorias”. Somos testemunhas imensas da esfera do cultural, “uma imensa e historicamente original aculturação do real”, “um salto quântico no que Benjamim ...chamou de esteticização da realidade”. A cultura tornou-se um “produto por direito próprio”, o processo de consumo cultural não é mais simplesmente um apêndice, mas a própria essência do funcionamento capitalista. (JAMESON apud KUMAR, 2006, p. 153)


A cultura na atualidade é um fator de grande importância para a explicação dos fenômenos sociais. Com o surgimento da sociedade da informação e da videocracia [8], ela manifesta-se super-dimensionada e rompe os limites com a realidade, acima de tudo porque hoje a sociedade contemporânea tem cultuado tanto as “imagens” que não sabe mais distinguir o que é real ou ficcional. (BAUDRILLARD, 1996, p. 93 e ss.)

A representação ganha tanta força na atualidade que tem rompido os limites com o real, colonizando-o, com forte tendência da ficção em se transformar na própria realidade em um processo denominado de hiper-realidade, semblante de real, simulacro, espetáculo, assumindo com isso o principal vetor de controle social dos comportamentos através da manipulação do imaginário social através de modulações de poder pós-panópticas na mídia, nas tecnologias de informação, no marketing.


O princípio da realidade coincidiu com um estágio determinado da lei do valor. Hoje, todo o sistema oscila na indeterminação, toda a realidade é absorvida pela hiper-realidade do código e da simulação. É um princípio de simulações que nos rege doravante em lugar do antigo princípio da realidade. As finalidades desapareceram; são os modelos que nos geram. (BAUDRILLARD, 1996, p. 8)


Assim, na sociedade dos consumidores, através de novos mecanismos de poder, a cultura simbolicamente é permeada e saturada por figuras, imagens, mensagens de querer, de busca da felicidade a qualquer custo, sem qualquer correlativo de limitação, responsabilidade ou tipo de castração. Existe, permeando todos os setores da sociedade, um imperativo de negação e fragilização das regras de interação social e até mesmo de negação do “outro”, sempre visto como simples objeto, coisa, oportunidade ou empecilho de lucro através do simples raciocínio utilitário dos custos e benefícios.

Máximas como ter “fama a qualquer custo”, “ter dinheiro por quaisquer meios”, “ter poder sem respeito ao outro”, “parecer com o ídolo do momento”, “acompanhar os ditames da moda”, “imitar as pessoas de sucesso”, “escutar os ditames dos especialistas”, “comprar aquilo que todos compram”, “ler aquilo que todos lêem” [9] parecem nortear o comportamento da grande maioria dos indivíduos e romper com qualquer valor estável, transparente e compartilhado de identificação entre as pessoas.


A hipertrofia da economia capitalista, diz-se, diluiu esferas da vida social, como a política, a religião e a tradição familiar, em um consumismo hedonista e narcisista que está na base do culto ao corpo e da epidemia de atentados violentos à vida. A delinqüência seria um efeito da avidez por objetos supérfluos e o culto ao corpo efeito do fascínio pelas imagens corporais da moda, ambos estimulados pela publicidade. (COSTA, 2005, p. 131)


Na sociedade da coerção para o consumo, qualquer respeito aos paradigmas intersubjetivos, comunicacionais e compartilhados de relação social, é interpretado como limitação das oportunidades oferecidas, como opressão, controle, homogeneização forçada, tirania do passado, falta de liberdade, desrespeito à diferença, fragilizados que eles são pelo assédio sempre envolvente da mídia que ativa de forma sempre crescente nos indivíduos desejos, afetos, modelos de interação.


O sonho de tornar menos apavorante a incerteza e mais profunda a felicidade está no cerne da obsessão dos consumidores com a manipulação de identidades, exigindo pouco sacrifício e nenhum esforço diário exaustivo, apenas por meio do aparato da mudança de ego – e de mudar o próprio ego usando roupas que não aderem à pele e que, portanto, não podem impedir novas mudanças. No caso da autodefinição e da autoconstrução, como em todas as atividades da vida, a cultura consumista permanece fiel a seu personagem e proíbe a acomodação final e qualquer satisfação perfeita, consumada, que não requeira novos aperfeiçoamentos. Na atividade chamada “construção de identidade”, o propósito verdadeiro, até mesmo secreto, é o descarte e a remoção de produtos fracassados ou não totalmente bem-sucedidos. Não admira que em nossa era, como Siegfried Kracauser sugeriu de maneira profética, a “personalidade integrada está indubitavelmente entre as superstições favoritas da psicologia moderna”. (BAUMAN, 2008, p. 145 e 146)


Dentro dessa perspectiva, trata-se de uma sociedade em que vigora a suprema mensagem do “cada um por si”, uma verdadeira “guerra de todos contra todos”, sem nenhuma convergência a figuras excepcionais de identificação, espécie de eu ideal, o que gera uma desconfiança geral das condutas alheias, onde todos se tornam pequenos tiranos e invejosos, predispostos psicologicamente à antecipação do ataque, ou a se isolar covardemente [10] nos novos Bunkers[11] da engenharia moderna. [12]

Os únicos “valores” que são ativados nas relações entre os indivíduos existem tão-somente como sinais de comutação de aparências e de equivalência teatral momentânea e contingente, os quais são ditados como modelos e guias de imitação, de compleição e efetividade bastante fraca, equivalente a uma roupa velha que os homens podem jogar fora a qualquer hora.

Os modelos e sinais de interação não formam regras sólidas, de referenciais duráveis e confiáveis para ações previsíveis, certas e garantidas dos indivíduos. Eles não fornecem mapas que possibilitem caminhos seguros do curso da vida, de vigência indiscutível e transparente, muito pelo contrário, neles os indivíduos não sabem exatamente como agir nas interações, tamanhos e contraditórios são os vetores de ação social na sociedade de consumo. [13]

Nessa perspectiva, são bastante visíveis nas relações sociais sinais de êxtase momentâneos de prazer e de correlata angústia de não gozá-los novamente (ou eternamente). Tais fatores são percebidos mais evidentemente quando as pessoas são instadas a comprar produtos fúteis tão-somente porque neles estão inscritos simbolicamente pelos meios de comunicação de massa representações coletivas que pretendem incorporar os sinais e caminhos da “verdadeira felicidade”. [14]

Decerto que ainda existem pessoas que compram produtos sob a ótica da utilidade ou mesmo com certa racionalidade econômica, mas a grande “massa” compra produtos no mercado com base nos sinais de status - ou mesmo fantasias sexuais, ou promessas de felicidade - incorporados no meio simbólico (representação social) pelos meios de comunicação social. Como pondera Baudrillard (1995, p. 22)


Sem rotular de primitivismo (e porque não?) os caçadores antropóides que erram actualmente na selva das nossas cidades, seria possível descobrir neles um apólogo sobre a sociedade de consumo. Também o miraculado consumo serve de todo um dispositivo de objectos simulacros e de sinais característicos da felicidade, esperando em seguida (no desespero, diria um moralista) que a felicidade venha ali poisar-se.

(...)

Não se procura desvendar agora um princípio de análise. Trata-se apenas da mentalidade de consumo privada e coletiva. No entanto, a este nível bastante superficial, é permitido arriscar a seguinte comparação: é o pensamento trágico que governa o consumo, é uma mentalidade sensível ao miraculoso que rege a vida quotidiana, é a mentalidade primitiva, no sentido em que foi definida como baseada na crença na onipotência dos pensamentos: no caso presente, trata-se da crença na onipotência dos signos. A opulência, a afluência não passa da acumulação de signos da felicidade. As satisfações que os objetos em si conferem são equivalentes dos aviões simulacros, dos modelos reduzidos dos Melanésios, ou seja, o reflexo antecipado da grande satisfação virtual, da opulência total, da jubilação derradeira dos miraculosos definitivos, cuja esperança louca alimenta a banalidade quotidiana. As satisfações menores reduzem-se ainda a simples práticas de exorcismo, a meios de captar e conjurar o bem-estar total, beatitude. Na prática quotidiana, os benefícios do consumo não se vivem como fruto do trabalho ou de processos de produção; vivem-se como milagre.


As pessoas compram as felicidades orquestradas pelo código simulacral sem sequer possuírem quaisquer necessidades do ponto de vista utilitário, ou até mesmo sem empunharem informações de cunho econômico, baseadas na comparação de preços – princípios que explicam (explicavam) a conformação real do produto - o que não deixa de ser um fator de irracionalidade.

Dessa forma, é o próprio mercado que leva os consumidores a aceitar modelos de condutas, levando-os às escolhas irracionais através de estratégias de sedução, apelando para desejos sexuais, fantasias de prazer ou mesmo de sinais de diferenciação social, ditados através de redes de construção de signos e formas estéticas de sensação, estratégias de controle dos comportamentos do consumidor que não possibilitam qualquer possibilidade de trocas comunicacionais intersubjetivas, mas tão-somente a uma simples absorção e assunção puramente apática de padrões e signos desligados da realidade por uma massa manipulada e “faminta de felicidade”.

Nestes termos, as coisas eivadas dos mitos simbólicos de felicidade são padrões performativos de ação frágeis, “verdadeiros” modelos de identificação social, os quais os indivíduos devem sempre acompanhar na labuta diária predispostos a possuir “deslumbrados” e “bestificados” sob pena de nulificação social, mas que, pelo contrário, nunca satisfazem e saciam o desejo como “prometem”, pois estão sempre no horizonte, longe de qualquer alcance, conformando as pessoas a uma construção ininterrupta e inacabada do Eu através de uma estratégica administração das insatisfações pelo “poder”. [15]

Acontece que na sociedade de consumo o indivíduo deve se tornar uma vitrine ambulante, ele deve se ornar com as etiquetas [16] e os formidáveis aparelhos de “última geração”, que funcionam na sociedade como fenótipos precários do caminho, mesmo que frágil, a percorrer, são sinais do reconhecimento social no capitalismo tardio, o famoso viver das “aparências”.


Transformações tecnológicas deslocaram o foco da forma capitalista de organização da esfera da produção de bens materiais para a infosfera, a esfera dos bens semiológicos. Com isso, o Semio-Kapital se torna a forma geral da economia. A acelerada criação de mais-valia depende da aceleração da infosfera. A digitalização abre o caminho para este tipo de aceleração. Signos são produzidos e postos em circulação numa velocidade crescente, mas o terminal humano do sistema (a mente incorporada) é colocado sob pressão crescente, e finalmente sofre colapso sob pressão. Creio que a atual crise econômica tem algo que ver com este desequilíbrio no campo da semio-produção e no campo da semio-demanda. Este desequilíbrio na relação entre a oferta de bens semióticos e o tempo socialmente disponível de atenção é o núcleo tanto da crise econômica quanto da crise intelectual e política que estamos sofrendo agora. (BERARDI, 2008)



Assim, é possível ponderar que o perigo de fratura social está nesse sentimento de angústia e de medo, no temor de não acompanhar as mudanças rápidas de uma sociedade obcecada pela novidade, pelas compras, pelas marcas, pelo supérfluo, cuja suscetibilidade a soluções drásticas pode possivelmente ser endereçado para a promoção penal, uma vez que na sociedade de hoje existe forte clamor da “opinião pública” por soluções ultra-rápidas e instantâneas para os problemas do pavor que são inclusive alicerçadas em vontades desesperadas e irracionais de “nortes seguros” para a ação social. Como afirma Toron (1996, p. 93):


Não é a ameaça real da criminalidade e da violência que conta para a definição de uma política de segurança e sim a percepção de tal ameaça pela coletividade. Estes sentimentos de ameaça, que dominam a população, são canalizados para reivindicações de imediato arrocho nos meios coercitivos e tornam o relaxamento dos Direitos fundamentais bem como sua corrosão pelo Estado não só toleráveis como objeto de exigência da população.


Tais sentimentos amplamente disseminados entre as pessoas, ressalte-se, o medo e a angústia, podem ser canalizados para projetos de negação do “outro” através de supostas “racionalizações” de inimigos. Pois o inimigo pode se tornar uma espécie de “racionalização” quando ninguém consegue de maneira satisfatória dá respostas aos problemas sociais, uma espécie de ponto de fuga. [17]

Desse modo, diante do surgimento de grandes complexidades no trato da questão social, vem surgindo com cada vez mais intensidade a identificação de supostos inimigos da humanidade, em tentativa desesperada de criar momentaneamente identificações em torno do “terror” [18], certa união social para resolução dos problemas que inclusive pode esconder novas formas de ideologização dos indivíduos e novas práticas políticas.

No sistema jurídico, por exemplo, passa a ser amplamente adotada uma nova concepção, a do direito penal do inimigo, que, diante da crise de legitimidade do sistema penal, do incremento dos problemas sociais e de um amplamente alardeado aumento dos índices de violência e criminalidade, tenta responsabilizar certa categoria dos indivíduos pelos dilemas de segurança na tentativa de excluí-los das proteções formais penais. Considera-se que o comportamento daqueles eleitos como inimigos, de forma autônoma e consciente, rompem de forma contumaz as expectativas de interação social do sistema social e devem por isso ser colocados na posição de inimigos da sociedade.


Nos conflitos no e ao redor do Oriente Médio o conceito já se encontra desde há muito. O Hamas estigmatiza o “inimigo sionista”; o presidente da Palestina, Abbas, denomina a “Israel” como Ariel Sharon o fazia com o antigo presidente da Palestina, “Arafat”: como inimigo. No Islâ os inimigos são os não-crentes, que serão excluídos da Umma (comunidade). A mídia norte-americana qualifica os rebeldes iraquianos de “força inimiga”, e esta denomina a Bush como “inimigo do Islâ, inimigo de Alá, inimigo dos muçulmanos”. O próprio Bush tem estilizado habilmente o conceito de inimigo como conceito de luta desde o 11 de setembro de 2001. (...) No marco desta retórica, o direito penal terrorista vem se convertendo cada vez mais em um direito penal do inimigo. (AMBOS, 2008, p. 7 e ss.)


Portanto, o medo na atual configuração social pode ser o principal vetor para o fenômeno da expansão penal. Analisar os motivos determinantes do surgimento e intensificação do medo na sociedade contemporânea parece se tornar imprescindível para um melhor diagnóstico da crise de legitimidade das garantias jurídico-penais e do fenômeno da expansão do sistema penal.


Anderson Eduardo Couto – SD nº. 5948 Couto

Policial Militar do Estado de Sergipe

Bacharel em Direito pela UFS


[1] O World Trade Center simbolizava o poderio econômico dos Estados Unidos e foi construído depois da Segunda Guerra Mundial.

[2] “Torres Gêmeas” é como ficou popularmente conhecido o Prédio World Trade Center localizado no centro financeiro de Nova York destruído no ataque terrorista em 11 de setembro de 2001, imputado a um grupo com vínculos com Al Qaeda composto em sua maioria por mulçumanos de origem Saudita.

[3] Energia nuclear, catástrofes naturais, meio ambiente, novas doenças, degradação urbana nas megalópoles, etc.

[4] Quem primeiro cunhou essa categoria para explicar a realidade atual foi o Cientista social Ulrich Bech em sua obra Risikogesellschaft - Auf dem Weg in eine andere Moderne (1986).

[5] Citamos o ataque às torres gêmeas, mas tal sentimento ainda foi intensificado com os ataques terroristas na Espanha e em Londres. No dia 11 de março de 2004, alvos de ataques terroristas, dois trens explodiram na Espanha, com 191 passageiros mortos e 1.824 feridos. No dia 7 de julho de 2005, Londres sofreu um ataque terrorista, quatro bombas exploridiram na cidade na hora do rush do transporte público. Como consequência, ocorreram 52 mortes e cerca de 700 pessoas foram feridas. Fontes: site do Jornal Estadão (http://www.estadao.com.br/interatividade/Multimidia), site da Veja (http://veja.abril.com.br/130705/p_082.html), Site do Jornal Folha (http://www1.folha.uol.com.br/folha)

[6] Interessante observar que a própria escolha dos alvos pelos terroristas no ataque demonstra nitidamente a intenção de buscar a maior repercussão midiática possível numa tentativa de “espetaculizar” seus efeitos.

[7] Viver no risco significa não possuir critérios seguros para agir na sociedade, e ainda não poder mais contar com as redes de proteção social devido à falência das mesmas em solucionar os problemas. Segue, então, que a vida no risco possui íntima ligação com as mudanças sociais na sociedade do risco. Para Beck (1997, p. 15), a sociedade do risco é uma fase no desenvolvimento da sociedade moderna, em que os riscos sociais, políticos, econômicos e individuais tendem cada vez mais escapar das instituições para o controle e a proteção da sociedade industrial. Tal situação fornece o ensejo a um retorno da incerteza nas relações sociais, que significa, para Beck (1997, p. 19), que cada vez mais os conflitos não são mais resolvidos no princípio da ordem da sociedade industrial, mas da ambigüidade e através da aplicação de cálculos de probabilidade.

[8] “Pasolini vê na televisão o medium mágico que, por força da sua linguagem físico-mímica ou comportamental, consegue fazer passar diretamente, sem mediações, um abstrato "modelo de vida" para os comportamentos de milhões de sujeitos reais, quais "cópias" vivas dos modelos representados no vídeo. De tal modo que "os heróis da propaganda televisiva (...) proliferam em milhões de heróis análogos na realidade". Uma espécie de versão microeletrônica e de massas da mais elitista teoria platónica das idéias. Um "modelo de vida" representado em linguagem comportamental, tornado visível, reprodutível e, portanto, "viável", pode, de facto, oferecer-se imediatamente como produto pronto para uso, para aquele uso que lhe é específico: a pura e simples imitação. Neste sentido, a televisão dá deste "modelo de vida" o que dele pode ser transformado automaticamente em comportamento de massas: a sua forma externa, a sua imagem, a sua face imediatamente visível e reprodutível. A sua convertibilidade pragmática em produto de consumo imediato. Não espanta, pois, que um tal mecanismo se possa transformar em elemento central daquilo a que Pasolini chamou a "nova ideologia hedonista do consumo". – Trecho do texto In vídeo veritas? - http://www.lxxl.pt/babel/biblioteca/video.html

[9] Engraçado, hoje em dia o que traduz a fama de um livro não é qualidade da escrita, as polêmicas e as discussões que suscita os dilemas, que apresenta a interpretação do vivido, mas sim os números de exemplares vendidos. Os famosos bestter sellers, divulgados nas revistas através do critério do número de vendas, se valem da propensão dos homens contemporâneos à imitação.

[10] “As áreas residenciais focam-se cada vez mais na privatização espacial, diminuindo ou elitizando os espaços públicos. Na verdade, é uma maneira de se protegerem dos bolsões de miséria que literalmente os cercam. Condomínios dentro de muros, com seguranças, garantindo um acesso restrito, aparecem cada vez mais, lembrando as velhas cidades muradas da Idade Média, porem com uma diferença: os muros hoje cruzam a cidade ao invés de cercá–la. Quando é necessário, o acesso físico dessa população das cidadelas aos parques temáticos espetaculares do reino do efêmero dos shoppings é feito por meio do automóvel. Cada vez mais essas pessoas procuram que seus bens de consumo venham a eles, garantindo sua chegada através do sistema de delivery, que assegura a concretização de quase tudo a sua frente em minutos e evita o confronto com o mundo exterior. Percorrer a cidade para eles é navegar pelo oceano do medo, que leva de um porto seguro a outro. Em Cidades Fantasmas, Fuão chama atenção justamente para essa retenção e repressão espacial sobre os corpos incentivada pelo uso da tecnologia, que faz com que o confinamento em nossas casas se torne cada vez maior, consagrando um tempo em que TVs e computadores substituem janelas. Não é a toa que a proliferação da violência urbana interessa aos banqueiros e as grandes empresas da comunicação e informática. Quanto mais perigosas e feias as ruas se tornarem, mais estaremos confinados e pagando pelo uso da energia e por eletrodomésticos que possibilitam a comunicação virtual com nossos semelhantes. Hoje, os cabos e fios desempenham as mesmas funções das ruas, quando precisamos deles para acessar informações e nos encontrarmos”. (PAESE, 2005, p. 7)

[11] Bunkers, em engenharia militar, são unidades de defesa a ataques ostensivos. Eles foram muito utilizados na segunda guerra mundial. Eles são unidades de defesa usadas ostensivamente durante guerras. São feitas de concreto e contam com aberturas que possibilitam o revide em caso de ataque. Embora na maioria das guerras construídas de concreto, também eram subterrâneas e de madeira, como foi o caso do Vietnã, no qual as casamatas eram de madeira e ficavam em local subterrâneo. São, muitas vezes, também conhecidas como "bunkers". A utilização de casamatas no Dia-D foi muito grande para revidar o ataque naval que partia dos aliados. O concreto chegava a ter 2 metros de expessura. Fonte: site Cruz de Ferro (http://www.cruzdeferro.com/index_arquivos/armas.htm)

[13] Não se quer dizer que os indivíduos não possuam qualquer tipo de valor para se abrigar, mas que os valores que existem no mercado são bastante frágeis e são criados justamente como vias de identificação passageira, possuem prazos de validade. Existe grande diferença entre um valor criado através de trocas simbólicas no dia-a-dia, e o valor criado pelas redes de signos dos meios de comunicação de massa. Enquanto os valores tradicionais podiam ser descritos como ideais, os valores do consumo são fluídos.

[14] Não poderia deixar de ocorrer aqui a ligação com as drogas. Parece que hoje em dia deixar de “comprar no mercado” causa tremenda crise de abstinência. Por isso, é preciso compulsivamente usar a “droga” do cartão de crédito.

[15] Parece-me que as empresas podem colocar no mercado numerosas inovações nos produtos, mas prefere as doses homeopáticas para criar nos consumidores a sensação de novidade.

[16] “Diga que marca usa, que te direi quem és”.

[17] As manifestações neonazistas da Europa podem ser descritas nessa linha. As torcidas organizadas de futebol não seriam também formas de alivio das angústias e medos do cotidiano na atualidade, as quais traduzem através da identificação violenta de supostos inimigos (a torcida de outros times) uma espécie de união no terror? E os carecas do ABC ... ? Muitos estudiosos têm ligado a intensificação desses novos grupos às questões de medo na sociedade contemporânea.

[18] Por exemplo, depois do ato terrorista, a identificação social se resumia à “todos contra Bin Laden”.


BIBLIOGRAFIA


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BERARDI, Franco. Pânico, Guerra e Semio-Kapital. Site Rizoma Conspirologia. Disponível em: http://www.rizoma.net/interna.php?id=180&secao=conspirologia Acesso em: 28 dezembro de 2008.


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TORON, Alberto Zacharias. Crimes Hediondos – O Mito da Repressão Penal. Editora Revista dos Tribunais, São Paulo, 1996.


Anderson Couto

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